Consideremos a
referência aos portugueses de Jonathan
Swift, no final do seu celebrado livro, irónico, mas, ao final, com um desfecho
para a responsabilidade e plena de calor humano, onde se exibem aspetos paradigmáticos de humanidade que jamais encontrara:
«Um
dos marinheiros, em Português, mandou-me subir, e perguntou quem eu
era. (...)
Os bons Portugueses ficaram igualmente espantados com a minha
singular vestimenta, e a dicção estranha das minhas palavras, que,
no entanto, eles entenderam muito bem. Falaram-me com grande
humanidade, e disseram: 'tinham a certeza que o capitão me levaria
grátis para Lisboa, onde eu poderia voltar para o meu país (…).
[O nome do Capitão] era Pedro de
Mendez, uma pessoa muito cortês e generosa. (...)
Em dez dias, Dom Pedro, a quem eu tinha dado conta de alguns dos meus
assuntos privados, impôs-me como uma questão de honra e consciência
, 'que eu deveria voltar para o meu país natal, e morar com minha
esposa e filhos'. Ele disse-me, 'havia um navio Inglês no porto
pronto para sair, e ele iria fornecer-me todas as coisas
necessárias.' Seria fastidioso repetir seus argumentos, e minhas
contradições. Ele disse, "era completamente impossível
encontrar uma ilha tão solitária como eu desejava para viver, mas
eu poderia ser senhor em minha própria casa, e passar o meu tempo de
forma tão reclusa quanto quisesse.' Acedi (...).
Saí de Lisboa no dia 24 de novembro, num navio mercante Inglês, mas
quem era o mestre nunca perguntei. Dom Pedro acompanhou-me até ao
navio, e me emprestou vinte libras. Despediu-se gentilmente de mim, e
abraçou-me na despedida (…).»
Jonathan
Swift,
Viagens de Gulliver,
1726